Presidente da SPPCV no biénio 2017/2018, o ortopedista Manuel Tavares de Matos esteve, desde sempre, envolvido na vida desta sociedade científica, sendo também seu sócio fundador. Ao fazer uma avaliação muito positiva do trabalho da Direção que presidiu, Manuel Tavares de Matos não deixa de referir que, no seu entender, a melhoria da qualidade e do seguimento dos doentes com patologia da coluna vertebral está, intimamente, ligada ao estabelecimento de uma nova especialidade médica, a de “cirurgia da coluna vertebral”. Este é também um dos desígnios da SPPCV.
Foi presidente da SPPCV no biénio 2017/2018 qual o balanço que faz deste mandato? Cumpriu os objetivos a que se propôs?
Manuel Tavares de Matos (MTM) – Faço um balanço muito positivo. Mantivemos todos os projetos assumidos pelas direções anteriores e iniciámos outros. Por exemplo, estabelecemos o primeiro Eurospine Course Diploma, em Portugal e em Espanha (o segundo curso fora de Estrasburgo), um evento de grande investimento pessoal de toda a equipa e muito sem esquecer o empenho notável da nossa querida secretária Cristiana.
Além de todo o processo inicial de contactos e pedidos, foi também necessário coordenar e garantir todos os requisitos da Eurospine; montar o programa adotado; congregar e equilibrar as vontades de duas sociedades de diferentes países; assumir toda a logística que acompanha um evento, envolvendo várias casas de material num desígnio comum, num curso de uma semana em Portugal e outra em Espanha, dividido em períodos de cadlab e de discussão teórica.
Planear e assumir uma faculty que garantisse a qualidade, disponibilidade e presença no evento, com colegas vindos de vários locais de Espanha e Portugal; fazer a promoção do evento; e conseguir patrocínios que garantissem não só a sua sustentabilidade, mas também a adesão dos participantes.
Lançámos também um novo site, atualizado, amigável, simples e mais intuitivo com acesso a partir de plataformas móveis e procurámos mantê-lo atualizado. Abrimos uma conta no Twitter e outra no Facebook.
Iniciámos uma parceria com uma agência de comunicação em saúde; começámos uma newsletter para os sócios; gravámos os eventos efetuados (congressos, Eurospine Diploma), em registo de alta qualidade; e tornámo-los acessíveis remotamente, incitando um sistema de vantagens exclusivas para sócios.
Mas fizemos mais, conseguimos diminuir substancialmente o valor pago pelos participantes nos congressos; deixámos o simpósio gratuito para sócios e adaptámo-nos às novas leis, que regem a participação da Indústria.
Também, estivemos representados no XVI Brazilian Spine Congress (CBC 2017), no XIV Ibero-LatinAmerican Spine Congress (SILACO 2017), no II Congress of International Society of Craniovertebral Junction and Spine e no I BRICS Spine Meetings, com uma notável participação de trabalhos científicos.
Participámos no Curso Pré-Congreso GEER/NASS, “Tecnologías emergentes y el tratamiento del dolor lumbar”, em Ávila, e, deste modo, estabelecemos novas parcerias com a NASS e incrementámos a da SILACO, que culminaram no 1.º Curso Pré-Congresso NASS/SILACO, em 2019.
Promovemos atividades de consciencialização e informação para determinadas temáticas, junto das escolas e dos media, para a população em geral. Apresentámos o relatório “Panorama da cirurgia em coluna vertebral no SNS”, que teve há dias a sua primeira atualização; e apoiámos a entrega de uma petição, com vista a redução e regulamentação do peso das mochilas dos alunos.
Participámos no Word Spine Congress 2018, quer no Pré-Meeting, em Lisboa, quer no Congresso, no Porto, provendo a sessão “The Rise and Fall of Fantastique Technologies”.
Desenvolvemos um ambicioso programa para o Congresso, que foi abrilhantado com as participações do Prof. Ralf Wagner, do Prof. Sebastian Ruetten, do Prof. Alberto Ulloa, do Prof. Claudio Lamartina, do Prof. J. C Le Huec e do Dr. Ibrahim Obeid, entre outros. E, promovemos parcerias com AOSpine, que culminaram com a participação do Prof. Patrick Tropiano, no congresso.
Estabelecemos as bases e fizemos o programa para as primeiras sessões monotemáticas em cirurgia da coluna.
Praticamente, duplicámos os resultados líquidos, que eram de 69.736 euros, em 2016, e passaram para 138.462 euros, em 2018.
Os sócios da SPPCV, que eram sócios da Eurospine, mais que triplicaram, no período 2017/2018; e, sobretudo, aumentámos a principal grandeza da sociedade. Tornámo-la substancialmente maior, passando de 119 sócios, em 2016, para 139 em 2018.
Quais os próximos passos para a melhoria e desenvolvimento do tratamento e do seguimento dos doentes com patologia da coluna vertebral?
MTM – O desenvolvimento de melhores cuidados de saúde nesta área tem de estar intimamente relacionado com a SPPCV, sua maior visibilidade, autonomia e crescimento. São os seus membros quem melhor conhece não só a realidade portuguesa no que concerne à patologia da coluna, mas também quem melhor sabe como prevenir, cuidar e tratar.
Deve haver um plano de ação, a 10 anos, com objetivos e metas bem definidos, uma estratégia de crescimento, a adoção de um modelo de financiamento, pelas regras de compliance, o estabelecimento de estratégias de Marketing, assim como a política de comunicação da SPPCV.
É fundamental a ligação à Eurospine, assim como um firme desejo de conseguir ter uma especialidade em cirurgia de coluna. De alguma maneira, o primeiro passo foi dado com o “Iberian Course Diploma”, que pode ser um modo de conseguir uma certificação creditada pela Ordem dos Médicos.
É necessário o envolvimento da sociedade com o Ministério da Saúde e a Administração Regional de Saúde, faculdades de Medicina, sindicatos e com a Ordem dos Médicos.
Na altura formei cinco comissões, que teriam como objetivo dar os passos necessários para uma melhoria contínua da qualidade e desenvolvimento dos pilares estratégicos para crescimento da sociedade. Eram elas a Comissão para a Codificação em Cirurgia de Coluna; a Comissão para a Informação, Educação do Paciente e Marketing em Cirurgia da Coluna. Foram também formadas a Comissão para a Competência e Certificação em Cirurgia da Coluna, a Comissão para o Registo e Classificações (aplicação Spine Tango e através da definição de classificações e de metodologias de avaliação em coluna); e a Comissão para a Educação e Investigação em Cirurgia da Coluna.
Os objetivos das comissões estavam delineados, o programa estabelecido e os seus membros escolhidos, mas infelizmente o processo não avançou.
É sócio fundador da SPPCV, o que o levou a abraçar este desafio?
MTM – Foi um processo que se desenvolveu com naturalidade, pois, sempre estive num “ambiente de cirurgia de coluna”. Desde o meu primeiro ano de internato de Ortopedia, no Hospital de Sant’Ana, que me vi envolvido nas cirúrgicas de coluna, do Sr. Prof. Salis Amaral e, com a nossa ida para o Hospital de Egas Moniz, passei a integrar a equipa de coluna do Prof. Guimarães Consciência.
Sempre vivi interna e externamente num mundo de cirurgia de coluna, com sincero envolvimento pessoal. Destaco, em particular, o nascimento da AOSpine, em 2001, uma sociedade internacional precursora e impulsionadora do desenvolvimento da cirurgia da coluna. E a feliz circunstância de participar nos primeiros passos do seu desenvolvimento, nos seus primeiros eventos, nas reuniões de Brainstorming, em final de tarde, com Marinus De Kleuver, no aeroporto de Amesterdão; e do contacto com ilustres colegas, como Max Aebi, Dante Marchesi ou John Webb. Mantive esta forte ligação até hoje, sendo agora AOSpine educational advisor.
De algum modo, estava desperto para esta evolução em Portugal. Considero que a formação da SPPCV foi um ato de enorme lucidez, antecipação e arrojo por parte de um notável grupo de colegas, que sentiram necessidade de colaboração. Viram vantagem na discussão e na abrangência do tratamento entre especialidades afins, como o caminho para a melhoria dos cuidados a fornecer aos nossos pacientes. Associei-me imediatamente.
Alguns deles foram depois seus presidentes e muitos continuam felizmente a manter um registo ativo na sociedade.
Quais as principais necessidades que pretendiam responder com a criação desta sociedade científica?
MTM – Como expresso nos estatutos, a SPPCV foi criada com o “objetivo da promoção, estudo, investigação e divulgação das questões inerentes à problemática da prevenção, diagnóstico e tratamento das patologias da coluna vertebral” e de “fomentar as relações interdisciplinares entre os seus membros, bem como com entidades afins”.
Conseguiu-se muito até aos dias de hoje?
MTM – Sem dúvida. A motivação das várias direções abriu novos rumos, as novas tecnologias facilitaram a difusão da mensagem e aproximaram os sócios de sociedades congéneres. A especialização em cirurgia da coluna alavancada em novas abordagens MISS, endoscópica, navegação e robótica; novos e modernos hospitais privados, que acolheram e promoveram o acesso a procedimentos antes confinados a meia dúzia de hospitais públicos; e uma nova geração de especialistas, que vê a cirurgia de coluna de um modo mais global e uma área de verdadeira aposta, são tudo fatores que têm contribuído para o seu crescimento.
A aproximação à Eurospine abriu-nos uma enorme porta que há que saber manter aberta, por exemplo implementando o Spine Tango nos serviços, difundindo a Patient Line, iniciando o Advance Spine Diploma. Mas não só. A ligação científica que iniciámos com a GEER e promovemos com a SILACO, secundada numa amizade pessoal entre as direções deve ser mantida e reforçada. O mesmo com a AOSpine e com as sociedades Francesa e Italiana de cirurgia de coluna.
É necessário um pensamento estratégico a médio prazo que vá para além do período de uma direção. Considero que o verdadeiro desígnio da sociedade só se vai realizar e estabelecer quando, entre nós, tivermos uma especialidade em cirurgia da coluna vertebral.